Não quero dizer que os conhecedores e aficionados de arte não encontrem palavras para exaltar esses objetos. Eles são bastante eloqüentes, segundo me parece. Mas, geralmente, diante de uma grande obra de arte, cada um diz algo diferente do outro, e nenhum diz nada que resolva o problema para o admirador despretensioso. A meu ver, o que nos prende tão poderosamente só pode ser a intençãodo artista, até onde ele conseguiu expressá-la em sua obra e fazer-nos compreendê-la. Entendo que isto não pode ser simplesmente uma questão de compreensão intelectual; o que ele visa é despertar em nós a mesma atitude emocional, a mesma constelação mental que produziu nele o desejo de criar.Mas porque a intenção do artista não poderia ser comunicada e compreendida empalavras, como qualquer outro fato da vida mental? Talvez no que concerne ás grandes obras de arte, isto nunca seja possível sem a aplicação da psicanálise.” ( Freud, 1914/1969, p.213)
As primeiras manifestações do processo desencadeado em Hanold pelo relevo foram as fantasias que giravam em torno da figura que este representava. A figura parecia-lhe “atual”, no melhor sentido da palavra, e“viva”, como se o artista houvesse perpetuado no mármore uma visão colhida nas ruas. O arqueólogo batizou a figura de “Gradiva”, inspirando-se no epípeto do deus da guerra dirigindo-se ao combate – Mars Gradivus -Dotou a personalidade dela com um número cada vez maior de características. Ela poderia ter sido filha de um alto personagem, talvez de um patrício ligado ao culto de alguma divindade.Acreditava ver em seus traços uma origem grega, e por fimsentiu-se compelido a movê-la da vida agitada de uma capital para a mais tranqüila Pompéia , onde a fazia caminhar sobre as pedras de lava que facilitavam a travessia das ruas. (Freud, 1907, p.51)
A natureza generosa deu ao artista a capacidade de exprimir seus impulsos mais secretos, desconhecidos até por ele próprio, por meio dos quais ele cria; e estas obras impressionam enormemente outras pessoas estranhas ao artista e que desconhecem, elas também, a origem da emoção que sentem. Será que nada existe na obra de Leonardo para testemunhar aquilo que sua memória conservou como uma das impressões mais fortes de sua infância? Deveríamos certamente poder encontrar alguma coisa. Porém se considerarmos a transformação enorme que terá que sofrer qualquer impressão vivida por um artista antes que ela venha ser transformada em uma contribuição para uma obra de arte, teremos que observar um grande comedimento ao proclamarmos nossa certeza quanto ao resultado que chegamos em nossas pesquisas. Qualquer pessoa que pense nas pinturas de Leonardo recordar-se-á de um sorriso notável, ao mesmo tempo fascinante e misterioso, que ele punha nos lábios de seus modelos femininos. ( Freud, 1910, p.113)