BREUGHEL
A PARÁBOLA DOS CEGOS
"O qual só podemos introduzir aqui, relembrando o que ensinamos sobre o
desejo, a ser formulado como desejo do Outro, por ser, originalmente, desejo de
seu desejo. O que torna concebível a harmonia dos desejos, mas não sem perigo.
Pela simples razão de que, ao se ordenarem numa cadeia que se assemelha à procissão de cegos de Breughel,
cada um, sem dúvida, tem a mão na mão daquele que o precede, mas ninguém sabe
para onde todos estão indo.”
J.Lacan
(Escritos: Kant com Sade)
ARCIMBOLDO
O BIBLIOTECÁRIO
19 de Abril de
1961
“(...) tendo, por exemplo, de representar a
figura do bibliotecário de Rodolphe II, Arcimboldo o fez por uma reunião
complicada de utensílios principais da função do bibliotecário, a saber, os
livros dispostos sobre o quadro de maneira que a imagem de um rosto seja, mais
que sugerida, verdadeiramente imposta.
(...) este procedimento maneirista consiste
em realizar a imagem humana na sua figura essencial pela coalescência,
combinação, acumulação, de um amontoado de objetos (...) estes objetos, que têm
de qualquer modo uma função de máscara, mostram ao mesmo tempo a problemática
desta máscara (...) a função tão essencial da persona, que está todo o tempo no
primeiro plano da economia da presença humana (...) se há necessidade de
persona é que por trás, talvez, toda forma se dissimule e se esvaia.”
J. Lacan
(Seminário 8: A
Transferência)
MUNCH
O GRITO
17
de Março de 1965
"Na demanda
ao Outro, o sujeito demanda (...) que o Outro fale (...) é aqui
(..,) que(...) a
reprodução de Munch é (...) uma figura que me parece propicia para articular
para vocês um ponto maior(...) que se chama o silêncio.
(...) o que é o
grito? Quem ouviria este grito que nós não ouvimos? (...) ele impõe esse reino
do silêncio (...) no espaço fielmente centrado e aberto. Parece ali, que este
silêncio é de qualquer modo o correlativo que distingue na sua presença este
grito de toda outra modulação imaginável (...) O grito faz de qualquer modo o
silêncio se refugiar no impasse mesmo de onde ele jorra para que o silêncio
escape, mas já está feito.
Quando nós vemos a imagem de Munch, o grito
está atravessado pelo
espaço do
silêncio, sem que ele o habite. Eles não
estão ligados nem por
estarem juntos,
nem por se sucederem. O grito faz o abismo onde o silêncio se precipita.”
J.Lacan
(Seminário 12:
Problemas Cruciais para a Psicanálise)
JOHN
EVERETT MILLAIS
OFÉLIA
4 e
1l de Março de 1959
“O barômetro da posição de Hamlet em relação
ao desejo. nós o temos sob a forma do personagem Ofélia (...) é uma das
criações mais fascinantes propostas à
imaginação humana. Alguma coisa que
nós podemos chamar de o drama do objeto feminino. O drama do desejo do mundo
que aparece no limite de uma civilização sob a forma de Helena. (...) encarnada
no drama e na infelicidade de Ofélia (...) foi retomado sob inúmeras formas
pela criação estética, artística. (...) pelos pintores (...) na época
pré-Rafaelista (...) Ofélia flutuando em seu vestido na correnteza em que ela
se deixa, em sua loucura, levar. O quadro de Millais (...).”
J.Lacan
(Seminário 6: O
Desejo e a sua Interpretação)
DA
VINCI
SÃO JOÃO BATISTA
“A qual silêncio deve se obrigar agora o
analista para descobrir sob este lodo o dedo erguido de São João de Leonardo,
para que a interpretação encontre o horizonte desabitado do ser onde deve se
desdobrar sua virtude alusiva?”
J. Lacan
(Escritos: A Direção da Cura)
DEGAS
SEMIRAMIS
“Há talvez mais
de uma origem deste fenômeno estupefante que é a descoberta do inconsciente. O século
XIX foi surpreendentemente dominado pela ação de uma mulher, a saber, a rainha
Vitória. Sem dúvida precisava-se desta espécie de devastação para que houvesse
o que chamo de um sonho.
(...) a rainha
Vitória, vá lá uma mulher, não a mulher, que não existe, mas uma mulher entre
outras (...) da medida excepcional da rainha Vitória (...) uma mulher que é
rainha; é o que verdadeiramente se faz de melhor como vagina dentada, é mesmo
uma condição essencial – Semíramis devia ter uma vagina dentada, se vê bem
quando Degas a desenha.”
J.Lacan
(Seminario 22:
RSI)
VAN
GOGH
AS BOTAS
22 de Junho de
1960
“Comecem a ver viver as Botas de Van Gogh
nas suas incomensuráveis qualidades de belas.
Elas estão lá, elas nos fazem um signo de
inteligência, situado muito precisamente a igual distância do poder de
imaginação e daquele do significante. Este significante não está mesmo mais lá
significando a marcha, a fadiga (...), do calor humano, ele é apenas
significante do que significa um par de botas abandonado, quer dizer por sua
vez de uma presença e de uma ausência pura.
O que (...) faz destas botas uma espécie de
contrário e de análogo a um par de brotos, mostra que não se trata aí de
imitação, (...) mas, de pensar deste par que, (...) eles são por eles mesmos a
manifestação visível do belo.”
J. Lacan
(Seminário 7: A
Ética na Psicanálise)
CÉZANNE
AS MAÇÃS
10 de Fevereiro
de 1960
“(...) a finalidade da arte é de imitar ou
não imitar? A arte imita o que representa? (...) no momento quando Cézanne faz
as maçãs, ele faz outra coisa que imitar pomos, ainda que sua última maneira
(...) seja mais orientada na direção de uma técnica de presentificação do
desejo. Mas, quanto mais o objeto é presentificado que imitado, mais ele nos
abre esta dimensão onde a ilusão fracassa e visa outra coisa (...) Há um
mistério na maneira que tem Cézanne de fazer suas maçãs, porque a relação com o
real (...) se renova na arte (...).”
J. Lacan
(Seminário 7: A
Ética na Psicanálise)
VELÁZQUEZ
AS MENINAS
20 de Março de
1968
“(...) no momento em que a perspectiva vem
na própria estrutura (...) aí aparece esta estrutura fechada que é aquela a
partir da qual pude tentar isolar para vocês (...) a função do pequeno objeto a
que se chama o olhar (...) em torno do quadro das meninas eu fiz para vocês uma
exposição (...) que é preciso tomar como (...) referência de conduta para o
psicanalista.”
J. Lacan
(Seminário 15: O
Ato Psicanalítico)
JACOPO
ZUCCHI
PSICHE SORPRENDE
AMORE
12 de Abril de
1961
“(...) no museu de Borghèse (...) um quadro
de um denominado Zucchi, (...) pintor (...) do primeiro período do maneirismo
(...) de um quadro que se chama Psiche Sorprende Amore, isto é, Eros. É a cena
clássica de Psiquê elevando sua pequena lâmpada sobre Eros, que é, já há algum
tempo, seu amante noturno, nunca visto.
(...) uma gota de óleo derramada revela Eros
(...) um facho luminoso que parte da lâmpada (...) a inclinação desse facho não
permite pensar que se trata desta gota de óleo, mas de um facho de luz.
(...) este buquê e esta flor (...) vistos
iluminados por trás (...) brilha uma luz intensa que incide sobre as coxas
alongadas e o ventre do personagem que simboliza Eros ... impossível não ver aí
(...) o órgão que deve automaticamente se dissimular por trás deste buquê de
flores (...) o falo de Eros.”
J.
Lacan
(Seminário
8: A Transferência)